ELIADE,Mircea.O sagrado e o profano.[tradução Rogério
Fernandes].São Paulo:Martins Fontes,1992.Pgs.13-57.
O historiador das religiões, Mircea
Eliade, começa, em sua Introdução, por nos brindar com uma menção sintética e
honrosa à obra de seu antecessor na pesquisa do Sagrado, Rudolf Otto. Eliade
pondera que “em vez de estudar as ideias de
Deus e de religião, Rudolf Otto aplicara-se na análise das modalidades da experiência religiosa [...] conseguiu
esclarecer o conteúdo e o caráter específico dessa experiência”
(ELIADE,1992,P.13). Otto dedica-se à irracionalidade da religião (ELIADE,1992,P.13).
Diferentemente de Otto, e a partir de sua definição ampla e mais complexa do
sagrado, isto é, “que ele se opõe ao profano” (ELIADE,1992,P.14), Eliade
pretende “ilustrar e precisar essa oposição entre o sagrado e o profano”
(ELIADE,1992,P.14).
O homem toma conhecimento do sagrado por
meio de sua hierofania, a qual sacraliza objetos e espaços que, não obstante,
mantem o que são, sendo, contudo, outra coisa (sagrada) agora
(ELIADE,1992,P.16). Eliade também tem por escopo “constatar que a dessacralização
caracteriza a experiência total do homem não-religioso das sociedades modernas”
(ELIADE,1992,P.17).
O sagrado e o profano constituem dois
modos de existir e/ou de ser no mundo, “duas modalidades de ser no mundo, duas
situações existenciais assumidas pelo homem ao longo da sua história”
(ELIADE,1992,P.18). E o interesse por esse objeto de estudo é multidisciplinar,
interessando a todo “investigador desejoso de conhecer as dimensões possíveis
da existência humana” (ELIADE,1992,P.16).
O primeiro capítulo propriamente dito
é sobre o espaço sagrado e a sacralização do mundo
((ELIADE,1992,Pgs.21-57). Não há
homogeneidade espacial na experiência religiosa; “para o homem religioso, o espaço não é homogêneo [...] há
porções de espaço qualitativamente diferentes das outras”
(ELIADE,1992,P.21). A rotura na
homogeneidade do espaço, ocasionada por uma hierofania, funda e/ou fixa
ontologicamente o mundo, revelando, outrossim, uma realidade absoluta
(ELIADE,1992,P.22). Na homogeneidade da extensão espacial, cria-se ou
revela-se, por meio da hierofania, um “ponto fixo”, um “centro”, ponto de
referência e de orientação existencial (ELIADE,1992,P.22). Pela criação de tal
“ponto fixo”, o espaço sagrado oferece uma orientação em meio a homogeneidade
caótica e/ou relativa do espaço profano, constituído este de “fragmentos de um
universo fragmentado”, onde os espaços são relativos e/ou relativizados, sem um
estatuto ontológico único, de acordo com as necessidades e/ou ditames de uma
“sociedade industrial” (ELIADE,1992,P.23).
Malgrado tudo isso, há também
“lugares sagrados” no espaço profano que dizem respeito à “outra realidade”,
diferente da do cotidiano (ELIADE,1992,P.24), porém sem dimensão religiosa.
Trata-se de percepção não-religiosa de “outra realidade” e outra
não-homogeneidade, símile do espaço sagrado, no espaço profano
(ELIADE,1992,P.21).
Sacralização do espaço profano pode
se dar por meio de uma teofania ou mesmo apenas de um sinal, evocatio, auxiliado por animais, com o
fim de livrar o homem da homegeneidade caótica, obtendo assim orientação
(ELIADE,1992,P.26). Ainda sobre a sacralização do espaço e/ou do mundo, Eliade
pontua que “a consagração de um território equivale à sua cosmização”
(ELIADE,1992,P.29), o que significa, outrossim, a (re) criação do cosmos, do
mundo e/ou sua ordenação cósmica (ELIADE,1992,P.29-30). Essas tomadas rituais
de terra são repetições cosmogônicas (ELIADE,1992,P.29-30). A comunicação com o
céu, subentendida e simbolizada na consagração territorial e sua cosmização,
constitui-se fator primordial de orientação, orientatio, frente ao caos do “nosso mundo” (ELIADE,1992,P.32,55). A
sacralização do mundo, então, nada mais é do que a busca pelo mundo primordial
das divindades cosmogônicas, tendo em vista o inserir-se nesse mesmo mundo,
nele vivendo e nele se completando: “é a experiência do Tempo sagrado que
permitirá ao homem religioso encontrar periodicamente o Cosmos tal como era in principio, no instante mítico da
Criação” (ELIADE,1992,P.58-57).
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